1.3.17

Sobre A Arte da Vida, de Zygmunt Bauman







«Um clássico da primeira à última linha»

«Não é uma lufada de ar fresco: antes o ar puído de uma biblioteca antiga, pesado como se exumássemos uma filosofia perdida de antanho. É que esta Arte da Vida, de Zygmunt Bauman, é clássica da primeira à última linha. O leitor sente as páginas como feitas dos pergaminhos de Marco Aurélio ou Epicteto, sente no pensamento limpo a solidão monacal dos moralistas, sem grandes transes, como quereriam Pascal ou La Bruyère, sereno como um anacoreta feliz com a contemplação que Aristóteles recomendava.
Tudo neste livro é clássico, desde o tema – aquilo que é necessário para a vida feliz, como escreveria um estóico – até ao tratamento: não tem pauis psicanalíticos, neurociência aplicada à moral, ou labirintos conceptuais. Trata do problema do desejo como os gregos o tratavam: como um problema de desejo e não de hormonas ou saudades dos pais.
Bauman parte de uma ideia que, embora verbalmente todos reconheçamos, tentamos frequente ignorar. O progresso não nos está a fazer mais felizes, diz. Nem o conforto baixa as doses de prozac, nem o conhecimento técnico construiu ainda uma máquina de felicidade, nem os médicos encontraram ainda o verdadeiro remédio santo. Quanto a isto, estaremos, sem grande discussão, de acordo. Bauman acrescenta, porém, que isto não é, estranhamente, razão suficiente para não o procurarmos como cura para a infelicidade. O mecanismo perverso do desejo faz-nos crer que se trata de uma questão de quantidade. Isto é, o progresso aumenta as necessidades, o consumo não as satisfaz, mas apenas porque não consumimos em dose suficiente. A felicidade apresenta-se sempre como alcançável, mas apenas no degrau acima do nosso.» [Carlos Maria Bobone, Observador, 28/2/2017]

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