8.6.16

Sobre Orlando, de Virginia Woolf




«Em Orlando, Woolf procura destruir todas as fronteiras que nos habituámos a prezar ao narrar a vida de uma personagem que, tal como Sasha, se esgueira por debaixo do cordão e, como se nada fosse, passa de um sexo para o outro ou do século XVI para o século XX, deixando-nos desconfortáveis ao vermos ruir a construção do mundo que fizéramos, cujos muros julgávamos indestrutíveis.

Virginia Woolf parece partir sempre de uma posição dogmática forte para depois a desconstruir totalmente. O romance abre com o jovem Orlando a golpear com uma espada uma cabeça de mouro suspensa das vigas do telhado de sua casa, sonhando com expedições futuras pelo Norte de África, para assim se afirmar desde logo a virilidade do protagonista da história. A escritora não deixa, aliás, margem para qualquer especulação ou ambiguidade ao começar o romance precisamente desta forma: “Ele — pois não poderia haver dúvidas quanto ao seu sexo, embora a moda da época contribuísse até certo ponto para o dissimular” (página 10). No entanto, poucas páginas depois, o mesmo Orlando terminará um noivado com uma rapariga por esta ter chicoteado à sua frente um cão, fazendo nascer à nossa frente uma certa sensibilidade, certamente feminina, de que até aí não suspeitávamos e que nos impede de compreender a verdadeira natureza do jovem.» [João Pedro Vala, Observador, 3-6-2016]

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